"Em o mundo que eu vi_ Editora Record _ Stefan Zweig narra o que sentiu e viveu no apagar das luzes do século XIX e no amanhecer do século XX inclusive a sua triste sina perpassando as duas grandes guerras e toda a perseguição que sofreu abalado pela onipresente ameaça nazista e pelo exílio e viagens nem sempre voluntárias pelo mundo, ele, e outros eminentes gênios de descendência judia.
Zweig através das suas viagens conhece a nata da intelectualidade do mundo moderno, aqui revitalizo algumas vividas aos olhos do grande ensaísta Stefan Zweig.
Ana Marly de Oliveira Jacobino
Rainer Maria Rilke o poeta de Stefan Zweig
Nascido em Praga em 1875, o poeta Rainer Maria Rilke viveu em primeira-mão a decomposição da Europa dos impérios e das aristocracias deterioradas. Originário de uma família da elite austro-húngara, dedica grande parte da sua vida adulta a viajar por todo o continente ao ritmo que lhe permitia a sua saúde, sempre frágil e enferma; cultiva também as suas amizades sempre mimadas através da sua infatigável busca pela escrita. Depois da Primeira Guerra Mundial e do desaparecimento do Império Austro-húngaro, Rilke torna-se num apátrida. Daí que o possamos considerar como um dos primeiros poetas genuinamente europeus da nossa época moderna, um desprovido de toda a paixão nacionalista tão cara aos seus contemporâneos.
Em 1902 foi para Paris, onde trabalhou como secretário do escultor Auguste Rodin entre 1905 a 1906. Rodin exerceu grande influência sobre o poema de Rilke, que se reflete em suas publicações de 1907 a 1908. Desde muito jovem que Rilke considerava o artista como um ser sem «outra pátria que ele mesmo», mostrando-se contrário à ideia de considerar os artistas de um país ou outro: “Que a Arte, no seu cume, não possa ser nacional faz que cada artista nasça, propriamente dito, para o estrangeiro”, escreve Rilke ao poeta russo Tsvétaïéva. Ora isto não surpreende, visto que este praguense que escrevia geralmente em alemão e que usava igualmente a língua francesa sem complexos para compor os seus versos, dava uso a um multilinguismo excepcional para a história da poesia europeia.
O Homem que lêEu lia há muito. Desde que esta tarde
com o seu ruído de chuva chegou às janelas.
Abstraí-me do vento lá fora:
o meu livro era difícil.
Olhei as suas páginas como rostos
que se ensombram pela profunda reflexão
e em redor da minha leitura parava o tempo. —
De repente sobre as páginas lançou-se uma luz
e em vez da tímida confusão de palavras
estava: tarde, tarde... em todas elas.
Não olho ainda para fora, mas rasgam-se já
as longas linhas, e as palavras rolam
dos seus fios, para onde elas querem.
Então sei: sobre os jardins
transbordantes, radiantes, abriram-se os céus;
o sol deve ter surgido de novo. —
E agora cai a noite de Verão, até onde a vista alcança:
o que está disperso ordena-se em poucos grupos,
obscuramente, pelos longos caminhos vão pessoas
e estranhamente longe, como se significasse algo mais,
ouve-se o pouco que ainda acontece.
E quando agora levantar os olhos deste livro,
nada será estranho, tudo grande.
Aí fora existe o que vivo dentro de mim
e aqui e mais além nada tem fronteiras;
apenas me entreteço mais ainda com ele
quando o meu olhar se adapta às coisas
e à grave simplicidade das multidões, —
então a terra cresce acima de si mesma.
E parece que abarca todo o céu:
a primeira estrela é como a última casa.
Rainer Maria Rilke, in "O Livro das Imagens" Tradução de Maria João Costa Pereira
com o seu ruído de chuva chegou às janelas.
Abstraí-me do vento lá fora:
o meu livro era difícil.
Olhei as suas páginas como rostos
que se ensombram pela profunda reflexão
e em redor da minha leitura parava o tempo. —
De repente sobre as páginas lançou-se uma luz
e em vez da tímida confusão de palavras
estava: tarde, tarde... em todas elas.
Não olho ainda para fora, mas rasgam-se já
as longas linhas, e as palavras rolam
dos seus fios, para onde elas querem.
Então sei: sobre os jardins
transbordantes, radiantes, abriram-se os céus;
o sol deve ter surgido de novo. —
E agora cai a noite de Verão, até onde a vista alcança:
o que está disperso ordena-se em poucos grupos,
obscuramente, pelos longos caminhos vão pessoas
e estranhamente longe, como se significasse algo mais,
ouve-se o pouco que ainda acontece.
E quando agora levantar os olhos deste livro,
nada será estranho, tudo grande.
Aí fora existe o que vivo dentro de mim
e aqui e mais além nada tem fronteiras;
apenas me entreteço mais ainda com ele
quando o meu olhar se adapta às coisas
e à grave simplicidade das multidões, —
então a terra cresce acima de si mesma.
E parece que abarca todo o céu:
a primeira estrela é como a última casa.
Rainer Maria Rilke, in "O Livro das Imagens" Tradução de Maria João Costa Pereira
Poema de Rilke já no final da sua vida.
1) A nossa penúltima palavraseria uma palavra de miséria,
mas atrás da consciência-mãe
o todo último será bonito.
Porque vai ser preciso resumir
todos os esforços de um desejo
que nenhum gosto de amargura
não saberá conter.
Stefan Zweig
O escritor nasceu em Viena, em 28 de novembro de 1881, típico produto de uma burguesia judaica culta na Áustria do fim de século. Filho do bem-sucedido fabricante têxtil judeu Moritz Zweig e de sua mulher Ida, nascida Brettauer, desde cedo ele soube que queria seguir a carreira literária, preparando-se cuidadosamente para ela... http://www.casastefanzweig.org/sec_vida.php Rios Bonfim, Rita (2010), Poemas e Pedras. Poesia em Pedra. Uma abordagem da correspondência entre a poesia e a escultura com base em obras de Rodin e Rilke., Edusp, São PauloRainer Maria Rilke. Cartas a um Jovem Poeta. Editora Globo, São Paulo, 1989 |
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