Ele, afetou o pensar de uma massa paralisada pelo comodismo! Suas palavras mostram a racionalidade de um poeta que percebe a realidade com olhos perspicazes, sem temer o julgamento tacanho de uma sociedade coberta pelo falso moralismo. Augusto dos Anjos, perseguido por todos os reveses na vida levou em frente o seu clamor poético! Neste 98 anos desta sua morte eu presto um tributo a Augusto do Anjos. Ana Marly de Oliveira Jacobino
A obra Eu, único livro de Augusto dos Anjos, foi editada pela primeira vez em 1912. Outras Poesias acrescentaram-se às edições posteriores. Na primeira edição, a capa branca exibia o título com grandes e vermelhas maiúsculas impressas no centro. No alto, as letras pretas com o nome do autor e, em baixo, cidade, Rio de Janeiro, e data, 1912. Falecido o poeta em 1914, Órris Soares reuniu à coletânea original (Eu) a produção recente de Augusto dos Anjos, incluindo mesmo um poema inacabado, A Meretriz. A Imprensa Oficial do Estado da Paraíba editou, em 1920, Eu e Outras Poesias, prefaciado pelo organizador. Augusto dos Anjos assombrou a elite letrada do país com seus versos que não eram parnasianos, nem antecipavam o modernismo. Eram apenas seus. E tamanha era a putrefação que seus versos representavam que, ainda hoje, ele é inclassificável em uma escola, e admirado como um poeta original. Considerado pelo público e pela critica, habituados á elegância parnasiana, um livro de mau gosto, malcriado, alguns dos poemas de Eu são vistos como os mais estranhos de toda a nossa literatura, por vários motivos. Dentre eles, ressaltamos o vocabulário pouco comum, repleto de palavras com forte carga cientificista; a multiplicidade de influências literárias que recebe, tornando difícil, se não impossível, sua classificação estilística e principalmente o desespero radical com que tematiza o fim de todas as ilusões românticas, a fatalidade da morte como apodrecimento inexorável do corpo, a visão do cosmos em seu processo irreversível de demolição de valores e sonhos humanos.
Asa de Corvo_ Augusto dos Anjos
##Asa de corvos carniceiros, asa
De mau agouro que, nos doze meses,
Cobre às vezes o espaço e cobre às vezes
O telhado de nossa própria casa...
##Perseguido por todos os reveses,
É meu destino viver junto a essa asa,
Como a cinza que vive junto à brasa,
Como os Goncourts, como os irmãos siameses!
##É com essa asa que eu faço este soneto
E a indústria humana faz o pano preto
Que as famílias de luto martiriza...
##Asa de corvos carniceiros, asa
De mau agouro que, nos doze meses,
Cobre às vezes o espaço e cobre às vezes
O telhado de nossa própria casa...
##Perseguido por todos os reveses,
É meu destino viver junto a essa asa,
Como a cinza que vive junto à brasa,
Como os Goncourts, como os irmãos siameses!
##É com essa asa que eu faço este soneto
E a indústria humana faz o pano preto
Que as famílias de luto martiriza...
##É ainda com essa asa extraordinária
Que a Morte — a costureira funerária —
Cose para o homem a última camisa!
Que a Morte — a costureira funerária —
Cose para o homem a última camisa!
Sofredora_Augusto dos Anjos
## Cobre-lhe a fria palidez do rosto
O sendal da tristeza que a desola;
Chora - o orvalho do pranto lhe perola
As faces maceradas de desgosto.
## Quando o rosário de seu pranto rola,
Das brancas rosas do seu triste rosto
Que rolam murchas como um sol já posto
Um perfume de lágrimas se evola.
## Tenta às vezes, porém, nervosa e louca
Esquecer por momento a mágoa intensa
Arrancando um sorriso à flor da boca.
## Mas volta logo um negro desconforto,
Bela na Dor, sublime na Descrença.
Como Jesus a soluçar no Horto!
## Cobre-lhe a fria palidez do rosto
O sendal da tristeza que a desola;
Chora - o orvalho do pranto lhe perola
As faces maceradas de desgosto.
## Quando o rosário de seu pranto rola,
Das brancas rosas do seu triste rosto
Que rolam murchas como um sol já posto
Um perfume de lágrimas se evola.
## Tenta às vezes, porém, nervosa e louca
Esquecer por momento a mágoa intensa
Arrancando um sorriso à flor da boca.
## Mas volta logo um negro desconforto,
Bela na Dor, sublime na Descrença.
Como Jesus a soluçar no Horto!
Conta o pesquisador, Horácio de Almeida, que a
os 17 anos, naquela mesma idade em que, trinta anos antes, Rimbaud escrevera Bateau ivre, Augusto compôs Monólogos de uma Sombra, poema que abre o Eu e Outras Poesias. Não sei se Augusto leu alguma vez Rimbaud, mas há casos em que a vidência poética de um é manifesta no outro. Em Monólogos de uma Sombra é a Sombra que fala e a Sombra é o eu do poeta, Em Bateau ivre quem fala é o barco ébrio e conta a sua derrota, que é a derrota da humanidade. Não há, todavia, nas duas composições uma coincidência de temas, mas há paralelismo de símbolos e de força criadora. Vejamos, como amostra, as duas primeiras estrofes dos Monólogos:
Sou uma Sombra. Venho de outras eras,
Do cosmopolitismo das moneras...
Pólipo de recônditas reentrâncias,
Larva do caos telúrico, procedo
Da escuridão do cósmico segredo,
Da substância de todas as substâncias.
A simbiose das coisas me equilibra.
Em minha ignota mônada, ampla, vibra
A alma dos movimentos rotatórios...
E é de mim que decorrem, simultâneas,
A saúde das forças subterrâneas,
E a morbidez dos seres ilusórios!
Prorrogação da inscriçaõ para o Prêmio Escriba de Poesias.
fotos google
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