100 anos da sua morte, ele que viveu pouco. mas, escreveu muito!Ana Marly de Oliveira Jacobino
Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos
“Acostuma-te à lama que te espera! o homem, que, nesta terra miserável,
mora, entra feras, sente inevitável necessidade de também ser fera.”
―Augusto dos Anjos
―Augusto dos Anjos
Ele nasceu no Engenho
Pau d'Arco, Paraíba, no dia 20 de abril de 1884. Aprendeu com seu
pai, bacharel, as primeiras letras. Fez o curso secundário no Liceu
Paraibano, já sendo dado como doentio e nervoso por testemunhos da
época. De uma família de proprietários de engenhos, assiste, nos primeiros
anos do século XX, à decadência da antiga estrutura latifundiária,
substituída pelas grandes usinas. Em 1903, matricula-se na Faculdade
de Direito do Recife, formando-se em 1907. Ali teve contato com o
trabalho "A Poesia Científica", do professor Martins Junior. Formado
em direito, não advogou; vivia de ensinar português. Casou-se, em
04 de julho de 1910, com Ester Fialho. Nesse ano, em conseqüência
de desentendimento com o governador, é afastado do cargo de professor
do Liceu Paraibano. Muda-se para o Rio de Janeiro e dedica-se ao magistério.
Versos Íntimos
Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua
última quimera.
Somente a Ingratidão – esta pantera –
Foi tua
companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que,
nesta terra miserável,
Mora entre feras, sente inevitável
Necessidade
de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo,
é a véspera do escarro
, A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a
alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
https://www.youtube.com/watch?v=syhAWdnUET4
Cético em relação às possibilidades do amor ("Não sou capaz de
amar mulher alguma, / Nem há mulher talvez capaz de amar-me"),
Augusto dos Anjos fez da obsessão com o próprio "eu" o centro do seu
pensamento. Não raro, o amor se converte em ódio, as coisas despertam
nojo e tudo é egoísmo e angústia em seu livro patético ("Ai! Um
urubu pousou na minha sorte"). A vida e suas facetas, para o poeta
que aspira à morte e à anulação de sua pessoa, reduzem-se a combinações
de elementos químicos, forças obscuras, fatalidades de leis físicas
e biológicas, decomposições de moléculas. Tal materialismo, longe
de aplacar sua angústia, sedimentou-lhe o amargo pessimismo ("Tome,
doutor, essa tesoura e corte / Minha singularíssima pessoa").
Ao asco de volúpia e à inapetência para o prazer contrapõe-se porém
um veemente desejo de conhecer outros mundos, outras plagas, onde
a força dos instintos não cerceie os vôos da alma ("Quero, arrancado
das prisões carnais, / Viver na luz dos astros imortais").
A métrica rígida, a cadência musical, as aliterações e rimas preciosas
dos versos fundiram-se ao esdrúxulo vocabulário extraído da área científica
para fazer do "Eu" - desde 1919 constantemente reeditado como "Eu
e outras poesias" - um livro que sobrevive, antes de tudo, pelo rigor
da forma. Com o tempo, Augusto dos Anjos tornou-se um dos poetas mais
lidos do país, sobrevivendo às mutações da cultura e a seus diversos
modismos como um fenômeno incomum de aceitação popular. Vitimado pela
pneumonia aos trinta anos de idade, morreu em Leopoldina em 12 de
novembro de 1914.
http://www.casadobruxo.com.br/poesia/a/aanjosbio.htm
Psicologia de um vencido
Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.
Produndissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.
Já o verme — este operário das ruínas —
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,
Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há-de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!
Augusto dos AnjosEu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.
Produndissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância...
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.
Já o verme — este operário das ruínas —
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,
Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há-de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!
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