INFANCIA REJEITADA
“Pés no chão, endurecidos de tão frios
Nus, como o verde das palmeiras
Que lava-enxuga, lava-enxuga
Para a crueza da noite, meias estampadas:
São folhas do jornal da sexta-feira.
Uma luz de alumínio sobre a manchete:
A CPI da corrupção não deu em nada
... no corrimão da madrugada, dorme um pivete.
(Chão de Vento . Flora Figueiredo)
No Brasil colônia, a vida das crianças corria inúmeros riscos. As condições de higiene do parto eram precárias, o bebe vinha ao mundo cercado de gente e expostos a contato com todo tipo de microorganismo.
Logo que nascia, o bebe era lavado enfaixado e enrolado em panos, e se a família tinha posses, em rendas e itas. O hábito de enfaixar a criança, que se manteve até o século XX, muitas vezes provocava sufocamento e atrofia. Também eram usados cueiros, toucas para proteger do frio e dos ventos.
A mortalidade infantil era alto, e ainda no final do século XVIII, a situação não havia melhorado, pois as crianças eram mais suscetíveis às freqüentes epidemias.
Medalhas de santos e outros objetos de cunho sagrado eram usados para proteção, pois acreditavam-se que mães e bebes eram alvos mais sensíveis à inveja e a maldade alheia, principalmente a bruxarias.
A escolha do nome da criança marcava sua entrada no seio da família, a qual ela deveria sua identidade até o inicio da vida adulta. Esta escolha baseava-se nas tradições religiosas ou familiares e homenageava santos, parentes ou padrinhos.
A primeira infância era passada na casa dos pais, em companhia das amas de leite, recrutadas entre as escravas recém paridas.
A criança não despertava ou merecia cuidados especiais, sendo tratada como um adulto pequeno.
Também no Brasil colônia, eram grandes os números de crianças abandonadas nas ruas ou nas portas das casas. Muitas morriam de fome, frio ou pelo ataque de animais.
Nesta época, desde que a vida da criança não fosse colocada em risco, sem abandono não constituía crime. As câmaras municipais tinham a responsabilidade de cuidar das crianças enjeitadas, o que eram feito geralmente por meio das santas casas de misericórdia.
Para garantir proteção as crianças e, ao mesmo tempo, permitir que os pais que as abandonavam permanecessem no anonimato, as santas casas passaram a adotar o sistema de rodas. As rodas era uma caixa redonda e giratória instalada na portaria da santa casa, onde se podia colocar a criança enjeitadas, girando a roda para dentro, a criança era recolhida.
A utilização desse tipo de engrenagem permitiria a identidade de quem “lançava” a criança na roda não fosse conhecida.
As casas de expostos, depósitos de expostos ou casa da roda, eram, portanto, as designações mais conhecidas para se identificar asilos de menores abandonados.
O benfeitor que contribuía e dava assistência aos expostos eram lembrados carinhosamente como “pai dos sem pais”.
As condições higiênicas dessas localidades não eram boas. Em torno da metade das crianças acabavam morrendo nos asilos. As autoridades preocupavam-se, por outro lado, em não receber enjeitados negros ou mulatos. Pra que gastar com escravos ou mestiço? Na luta pela vida somente aos brancos esquecidos eram oferecida algumas possibilidades de sobrevivência.
Muitos dos expostos acabavam sendo adotados, outros enjeitados até mesmo pelos asilos só restavam um destino: a morte.
No Brasil hoje é enorme o número de crianças miseráveis, desnutridas, sem amparo familiar e legal, jogados à sua própria sorte, nas ruas, nos becos, embaixo das pontes, tendo como cama as calçadas e porta das lojas.
Um exercito de crianças famintas e carentes chamadas de menores abandonadas, que fazem parte do futuro da nação, muito sombrio. De menor abandonado , a menor infrator, se torna trombadinha que se lança no quase ao certo no vício em drogas, roubo e assassinato.
Vemos que o abandono de criança, não é um fato apenas do nosso tempo. Sempre se abandonaram crianças no Brasil. Os motivos do abandono são inúmeros.
Muitos “enjeitados” para designar a criança abandonada, eram filhos de mulheres brancas, que os abandonavam para esconder o fruto de amores proibidos, ou eram de famílias miseráveis, que se livraram de mais uma “boca” que não podiam alimentar.
A situação das crianças e jovens no passado e no presente tem muito a ver com a posição que seus pais ocupam na sociedade. Há séculos, como hoje, a condição de pobreza e miséria de inúmeras crianças esteve ligada as profundas desigualdades sociais existentes no Brasil.
Toda criança tem direito de ser tratada com carinho, amor, respeito e merecem compreensão, educação, saúde e principalmente atenção das famílias e das autoridades.
Sandra Maria Vacchi é professora de historia da rede estadual de educação
Email: sandravacchi@yahoo.com.br
Ana Marly,
ResponderExcluirMuito bacana você ter colocado um artigo da Sandra, ela escreve muito bem e é uma graça de pessoa.
Um abraço,
Ivana.
Pois é, o artigo contém uma pesquisa histórica muito importante, e a Sandra escreveu embasada e com maestria. Parabéns!
ResponderExcluirAna Marly de OLiveira Jacobino